da administração pública sine ira et studio à gestão municipal caprichosa, ii

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Ainda quanto a este episódio, pelos contexto e enredo respectivos, não é possível deixar de considerar a hipótese de se estar perante uma espécie de revanchismo. A suspeita é suscitada logo por a revogação da isenção do pagamento de taxas relacionadas com o licenciamento dos planos de sinalização temporária por causa das obras do ic9 ter sido proposta e aprovada sem conhecimento circunstanciado sobre o que motivou a mudança de posição do agrupamento de empresas responsável pela construção daquela via ou sequer haver confirmação de que, de facto, tal mudança aconteceu conforme alegado por um munícipe (vide os pontos 1 e 2 da proposta aqui). Só isto basta para demonstrar o desatino que foi propor e votar a revogação referida nos termos em que tal aconteceu. Desatino agravado na circunstância por o responsável maior por tais proposta e votação andar para aí a clamar perfunctoriamente por ética e responsabilidade. Ou querem lá ver que com a chegada do 25 de abril a ourém no outono de 2009 começou a considerar-se ético e responsável um órgão da administração pública regular-se pela cultura pistoleira do faroeste, de acordo com a qual primeiro dispara-se, depois é que se fazem as perguntas.

Mas siga-se a narrativa do caso.

O acordo relativo aos conflitos recenseados a propósito da construção do ic9 produziu "resultados muito satisfatórios para o município" (vide aqui, p. 17).

O município apelou à resolução de uma série de conflitos subsistentes à margem do acordo firmado (vide ibidem, p. 18) - entre os quais, o conflito (caso 39) referente às consequências da deslocalização da pa4 sobre a propriedade e a habitação de determinado munícipe (vide ibidem, p. 17).

O vereador que acompanhou o caso declarou ter defendido e tentado que a pa4 ficasse na via existente e nenhum ou mínimo fosse o prejuízo para tal municípe (vide «esclarecimento» aqui).

O munícipe, segundo alegação do próprio, saiu-se bem na defesa dos interesses respectivos e ainda lhe terão dito que a pa4 iria ficar na via existente (vide notícias de ourém, n.º 3860, 27.janeiro.2012, p. 11).

No entanto o vereador em causa, em vez de congratular-se com isto - afinal, disse o próprio, era o que pretendia -, saiu-se com esta pérola: "não posso aceitar que num dia fundamentem tecnicamente a impossibilidade [de localizar a pa4 na via existente] e no outro, perante uma pessoa que se opõe a nós, tenham uma posição de facilitismo" (ibidem). E como se não bastasse esta afirmação, foi com base nas considerações e sentenças aí expressas que, de modo tão caprichoso quão leviano - sem espécie alguma de consideração pela segurança e formalidades jurídicas a que devem obedecer os actos da administração pública -, propôs e votou a revogação de uma decisão anterior da câmara municipal, em jeito de punição.

A doutrina a este propósito é inequívoca. A revogação de uma decisão por parte de qualquer entidade administrativa deve observar um de dois propósitos, repor a legalidade ferida por um acto anterior ou permitir uma satisfação melhor do interesse público. Segundo Diogo Freitas do Amaral, "o acto revogatório praticado com vista à prossecução de outros fins que não aqueles que se acabam de referir padece de desvio de poder" (in curso de direito administrativo, vol. ii, coimbra, livraria almedina, 2001, p. 465).

Já agora, recuperem-se as expressões «perante uma pessoa que se opõe a nós» e «posição de facilitismo».

A primeira expressão é sintomática do modo tribal como o pessoal eleito pelo ps para a câmara municipal se relaciona com os oureenses, dividindo-os e, pelo que se constata, marcando «os que se opõem». No caso, a saliência dada à oposição do munícipe é também a medida da desconsideração por alguém que se bateu para garantir a integridade da propriedade e da cada em que vive.

A segunda expressão é indício do modo tão leviano quão prepotente como o vereador socialista reagiu. Se, como o próprio reconheceu, se baseou exclusivamente em informação de terceiros - «uma pessoa que se opõe a nós» -, o que é que lhe permitiu acusar e sentenciar a «posição de facilitismo»? O que é que objectivamente habilitou o aludido vereador a classificar como «posição de facilitismo» a alegada e suposta mudança de posição do consórcio responsável pelo ic9? A confirmar-se tal mudança, não poderá ter ocorrido em consequência de uma avaliação mais detida e circunstanciada do caso? Não poderá ter sobrelevado o propósito de resolver um conflito que subsistia associado à interposição de uma providência cautelar?, conforme exortação do município.

Enfim. A administração pública está obrigada a imparcialidade e a agir com base em fundamentos substantivos, devidamente informados e com acolhimento no ordenamento jurídico português, o que é bastante diverso de funcionar com base em volições emocionais, palpites, oscilações de estados de alma ou consoante guina a báscula dos humores de quem quer que seja.

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