da farsa e do efeito boomerang depois

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Ontem realizou-se uma sessão da assembleia municipal. Às tantas o presidente da câmara municipal decidiu brandir o o anuário financeiro dos municípios portugueses apresentado anteontem e ensaiou um número de ilusionismo, com o jeito com que granjeou fama. Para impressionar o auditório, invocou o facto de ourém ter sido o vigésimo nono município em que, em termos relativos, as transferências financeiras para as freguesias tiveram peso maior no conjunto da despesa em 2010 (p. 79). Muito bem, está documentado, não é invenção. Há só um problemazito na manobra. A parte maior do valor relativo a tais transferências corresponde a protocolos celebrados entre o município e freguesias no mandato anterior e faz parte do rol da «herança» que o presidente da câmara municipal maldisse enfática e repetidamente. O que significa que uma disposição parca à coerência bastava para ele não se ter exposto em manobra tão cuculídea quão patética. É que por diversas vezes censurou o montante atingido pelas transferências para as freguesias em 2010, acusou o motivo eleitoralista subjacente ao aumento de tais transferências e, mais, invocou o aumento referido e as consequências dele sobre a tesouraria do município como justificação para cortar grossamente nas transferências financeiras para as freguesias em 2011. Não foi por acaso que durante o ano passado, em diversas sessões da assembleia municipal, presidentes de junta de freguesia alertaram para algo tão básico como a limpeza de bermas e valetas, em razão de não terem sido garantidas transferências de competências e dinheiro do município para as freguesias que permitissem responder àquele tipo de problemas. Importa considerar este episódio pelo significado político que tem e para se perceber o descrédito que, como efeito boomerang, atinge quem sobre o mesmo assunto é capaz de produzir discursos antagónicos, ora derramando lamúrias e queixas sobre o que foi decidido por outros - ainda que através de votações por unanimidade, portanto incluindo votos de pessoal eleito pelo ps -, ora pretendendo colher os louros de tais decisões. Há cataventos que não guinam com tanta facilidade. Embalado e continuando a armação ao pingarelho, o presidente da câmara municipal aludiu também ao facto de ourém ter sido um dos municípios que em 2010 amortizou totalmente os empréstimos de prazo curto contraídos nesse ano (p. 139). Está bem, também é facto, não é invenção. No entanto, sendo facto, não é facto extraordinário. Há um ror de tempo que é assim, pois é costume por cá a contratação no início de cada ano civil de um empréstimo de prazo curto, chamado vulgarmente empréstimo de tesouraria, que é liquidado no final desse mesmo ano. Pelo que não há motivo para empinar de modo tão inchado com um facto que não se distingue do que, ano após ano, sucedeu durante os mandatos em que o psd esteve em maioria na câmara municipal. Por fim, para a tentativa de ludíbrio ser perfeita, o presidente da câmara municipal conseguiu passar como cão por vinha vindimada pelos indicadores incómodos, estes. Não surpreende. Como o socialismo festivo-festivaleiro é sobretudo um compromisso com o ilusionismo, este foi apenas mais um evento da e na tendência.

Apesar do espectáculo, sendo a farsa tão ostensiva, não há como evitar algumas perguntinhas. Ao presidente da câmara municipal não assiste uma réstia de noção da figura ridícula que faz com este tipo de exercícios de contorcionismo demagógico? Em redor dele, entre a brigada apparatchik-ó-pretoriana, a clientela partidária e o colégio serventuário, não há alguém capaz de o alertar ou amparar de modo a evitar que ele se enxovalhe neste tipo de números tribunícios? Não há na cisterna em que a maioria socialista na câmara municipal se encerrou alguém capaz de notar que este tipo de expedientes, baseados na desconsideração dos outros ou na consideração deles como lorpas, desacredita quem procede e continua a proceder de modo tão apostado no logro alheio?

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