operação «auditoria», iii

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(intermezzo para três notas)
Entretanto importa notar o seguinte.
(nota um)
Antes de mais note-se que o colégio de vereadores do psd não votou a favor da proposta de contratar a auditoria. Opôs-se não à realização da auditoria, opôs-se à entrega dela a uma empresa, por entender constituir despesa desnecessária e haver no município pessoal qualificado e capaz de executar a tarefa (vide acta da câmara municipal de 02.11.2009, pp. 4-5). Embora estes argumentos fossem atendíveis, na circunstância justificava optar-se por uma via que rompesse a cultura de opacidade sobre a situação financeira do município gerada pelos consulados anteriores por conta do pessoal do psd na câmara municipal. Porquê? Porque a execução da auditoria por uma empresa credenciada permitia uma perspectiva exterior sobre o município, resultando daí, como vantagem, a hipótese de ser diagnosticada a necessidade de alterar ou corrigir procedimentos que foram subsistindo, sem que alguém com responsabilidade política ou técnica tenha admitido ou percebido antes de modo consequente motivo para os modificar ou rectificar. Para além disto a prossecução do exercício de auditoria por uma entidade externa permitia inibir o efeito de vícios ou cumplicidades eventuais entre os planos político e técnico do município. Neste sentido, conquanto fosse assegurada a colaboração e a transmissão de informação fidedigna por parte dos serviços municipais a quem viesse realizar a auditoria, apesar do custo implicado, as vantagens de uma auditoria externa ao município pareciam ser significativas. Ainda assim, convém não iludir, este juízo fazia sentido no quadro estrito de uma projecção e de uma expectativa específicas, as de que o resultado da auditoria revelasse qualidade e, por aí, merecesse reconhecimento e acolhimento tanto dos membros dos órgãos do município quanto dos oureenses, não dando azo a controvérsia ou polémicas.
(nota dois)
Agora uma questão de metodologia. O prazo estabelecido para a realização da auditoria foi de sessenta dias. Entendendo-se sem dificuldade o desejo de obter rapidamente uma avaliação da situação financeira do município - até porque estavam a ser preparados os documentos previsionais para o exercício de 2010 e importava que fossem informados pelo resultado da auditoria -, não se entende com tanta facilidade a proposta e a aceitação do prazo referido. Sessenta dias é um intervalo de tempo escasso para proceder-se ao levantamento, à validação e à análise de informação recolhida em várias fontes, algumas delas - isto podia admitir-se sem consultar o horóscopo - reticentes a facultar os dados que viessem a ser solicitados pela empresa auditora. Havendo indícios e suspeitas de práticas não enquadradas nas regras das contratação e tramitação da administração pública, nomeadamente no que concerne à «encomenda» de determinados bens e serviços, surgia mais do que plausível existirem entidades - empresas, freguesias, associações - sem disposição ou vontade de colaborar no âmbito da auditoria, por temerem ser corresponsabilizadas por algo ou prejudicadas na sua relação futura com o município. Significa isto que qualquer pessoa cujas competência e responsabilidade não padecessem de astenia estava em condições de não iludir a probabilidade de ocorrência de derrapagens na recolha de informação e, por conseguinte, demora na entrega dos relatórios devidos. Mais. O prazo proposto pelo município e aceite pela deloitte implicava duas medidas. Uma afectação bastante significativa de recursos ao caso por parte da empresa auditora. E uma estratégia de contactos e recolha de informação que suscitasse respostas rápidas e não condicionadas pelo receio de ser revelado algo que importava ao município - ou a alguém - não ser revelado. O que exigia a implicação do município no processo, no sentido de, sem enquinar a missão em curso, nomeadamente a autonomia de exercício da deloitte, estimular a colaboração das entidades que viessem a ser contactadas, esclarecendo os responsáveis delas sobre a importância de prestarem informação autêntica e a inexistência de represálias por corresponderem com autenticidade às solicitações da empresa auditora.
(nota três)
Neste excurso importa também notar o alargamento desnecessário do espectro da auditoria encomendada. Percebendo-se e não se contestando a necessidade dos dois relatórios sobre a situação financeira do município, no sentido em que visavam clarificar e esclarecer algo envolto em dúvidas e suspeitas, o relatório de análise, orientação e propostas estratégicas era algo dispensável. Recorde-se que durante a campanha eleitoral acontecida pouco tempo antes o pessoal do ps havia apresentado como pauta de acção para o município um plano amanhado sob os auspícios de Augusto Mateus. Supõe-se que tenha sido realizado um trabalho de diagnóstico, pelo menos foi apresentada uma proposta política como se tal diagnóstico tivesse sido feito. O que significa que o pessoal do ps vinculou-se voluntariamente a um plano, vínculo que foi reforçado pelo facto de tal plano ter sido sufragado pelos oureenses e ter recebido o acolhimento da maioria deles. Acresce a isto que o tal relatório era tão mais dispensável quão sabido era a aposta do presidente da câmara municipal num congresso a realizar-se em março de 2010, com o propósito de que, dos contributos vários e da reflexão conjunta que viesse a acontecer - isto é, da implicação e da participação dos oureenses -, resultasse a definição consolidada de um conjunto de orientações estratégicas para o município. (Há-de tornar-se a este assunto num capítulo adiante, porque é matéria que fede.)
(a seguir)
Segue-se que - milagre da multiplicação - os sessentas dias triplicaram, os relatórios da auditoria vieram tarde, o presidente da câmara municipal apresentou-os à câmara municipal e à assembleia municipal mas decidiu comportar-se tipo o dono dos relatórios sou eu, ninguém que não seja comparsa lhes há-de pôr os olhos em cima, e o caso começou a enrolar-se como o rabo da porca. Nota-se o odor.

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