sinais, vii.iv

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O problema maior indiciado pela criação do pelouro «Fátima» é a consagração política da desorientação ou falta de orientação estratégica à escala municipal. Pelo que se consegue perceber (e atendendo ao que foi anunciado como seu conteúdo), o pelouro é focado estritamente na realidade de Fátima, foi concebido para servir e aproveitar Fátima, sem enquadrar a realidade de Fátima na unidade correspondente ao município de Ourém, antes destacando-a.

Embora não esteja no horizonte imediato a criação do município de Fátima, essa criação é prosseguida pelos fatimenses e pode ser assumida como cenário plausível, apesar da incerteza quanto à forma e ao momento da sua concretização. Ora, se não houver política e estratégia de enquadramento e de aproveitamento de Fátima num sentido alargado, no futuro será mais difícil fazer disseminar pelo território oureense as vantagens associadas ao turismo religioso ou decorrentes dele. Não existindo redes consolidadas, não sendo essas redes animadas por fluxos regulares, não havendo uma prática de cooperação económica entre os agentes locais, as vantagens simbióticas possíveis não serão aproveitadas. Poderão ser aproveitadas conquanto se perceba os proveitos mútuos e recíprocos que podem resultar da definição e da prossecução de uma estratégia assente numa perspectiva de território e não de paróquia. Enquanto a perspectiva paroquial se foca num lugar e no que acontece aí, a perspectiva territorial atenta não só aos lugares mas também aos fluxos que relacionam esses lugares entre si (e com outros). A consequência mais evidente da adopção desta perspectiva é a superação de uma visão autárcica, superação que permite perceber as articulações e as dinâmicas dos lugares através de quem aí vive, valendo como visão integrada e não como visão casuística e estática.

Neste sentido, impõe-se como condição e factor de desenvolvimento uma política de concertação local que dificilmente pode ser prosseguida se a lógica de integração reticular do território municipal não for entendida como referência maior. E, insista-se, o problema não reside tanto na criação do pelouro «Fátima» quanto no que subjaz a tal criação, seja como condição, seja como orientação política. Destacar Fátima é reconhecer a relevância que tem, mas importa que tal destaque não prejudique a federação de interesses locais que define e constitui o município.

É sobretudo a inexistência de um plano para o desenvolvimento integrado e sustentado do município de Ourém que faz com que as intervenções políticas tendam a ser casuais e pontuais, voluntaristas e oportunistas. O que é positivo em Fátima está e continuará a ser aproveitado - o que não é mau -, mas não há uma estratégia de estímulo, um acompanhamento e uma intervenção em relação aos lugares restantes do município, com dimensão e importância menores do que as de Fátima, porém igualmente merecedores de qualidade de vida e de oportunidades de desenvolvimento. Não existindo tal estratégia, resulta daí a perda gradual, a erosão, do potencial que tais lugares têm. Verifica-se isto, por exemplo, na cada vez menor capacidade de muitos lugares de Ourém para fixar pessoas e atrair investimento público ou empreendimentos privados. Olhando para o município de Ourém como agregado, é mais fácil explorar o filão de Fátima, que gera proveitos evidentes, do que apostar - o que significa investir - na criação de condições para o desenvolvimento de outras localidades e freguesias de Ourém. Tendência que vigorou e se acentuou durante os mandatos em que o psd teve maioria absoluta nos órgãos municipais e, agora, não obstante a mudança política acontecida, parece ter condições para continuar.

Há dimensões da realidade que são independentes das disposições e da vontade das pessoas. Por exemplo, embora possam ser melhoradas as condições de trânsito, a proximidade entre Fátima e as restantes localidades do município de Ourém é um factor que se impõe por si e que não deixará de existir. Mas em termos sociais e económicos pode ser feito muito mais, sem prejuízo ou diminuição das vantagens que Fátima tem e gera. É o princípio de integração territorial, entendido sob uma lógica de equidade, que deve ser promovido politicamente. Quaisquer que tenham sido os motivos da criação do pelouro «Fátima», o modo como foi configurado e apresentado publicamente não contribui para tal princípio. E isto é algo em que importa que, se há, a diferença política em relação ao que vigorou no passado constitua e produza diferença. No sentido seguinte: o município de Ourém concebido e assumido como unidade, um mosaico integrado, não como um território quebrado, com parcelas destacadas ou soltas, sem um vínculo solidário, que beneficie o conjunto e as partes e não apenas ou sobretudo algumas partes.

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