Paralelo tóing, iii

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Justifica-se voltar ao comunicado da secção local do psd (vide Notícias de Ourém, n.º 3728, 5.Junho.2009, p. 11) a que foi feita alusão nos posts anteriores. Embora contenha alguns pontos que focam questões relevantes e contribuem para perceber parte do complexo que condiciona a acção autárquica, o tom geral do comunicado vai no sentido de tentar iludir a responsabilidade do pessoal do psd em relação à situação financeira nada famosa do município de Ourém, transferindo-a para o governo, porque é do ps. O que suscita perplexidade. É verdade que o comunicado não faz menção à tese obtusa e já ensaiada por pessoal do psd segundo a qual fazer obra sem dinheiro é que é de gente capaz e responsável. Como qualquer pessoa com o mínimo de trambelho percebe, não há obra sem custos. E os custos cobrem-se com dinheiro, não com lérias. Portanto, quanto a isto, ao descartar aquele argumento tonto, o pessoal do psd revelou sensatez. Mas tal não é suficiente para arrumar o caso. Porque a tentativa de esquiva à responsabilidade que é manifesto no comunicado revela que o pessoal do psd, para além de não assumir os erros e os disparates que cometeu, não está disponível para os corrigir, no sentido em que a disponibilidade para tal pressupõe consciência e assunção desses mesmos erros e disparates.
Como é compreensível, a conjuntura de crise não ajuda a resolver o problema da falta de liquidez da tesouraria municipal. E em alguns aspectos o governo também não. Na relação com os municípios, os governos são assim. Distinguem-se pouco. E se houve governos mais simpáticos para os municípios no que toca às finanças locais, não foram seguramente os presididos por Cavaco Silva ou aquele em que Manuela Ferreira Leite foi ministra das finanças. O que não ilude ou alivia a responsabilidade do governo actual no que se refere, por exemplo, aos atrasos e às trapalhadas em torno do qren. Adiante.
Para se perceber o tom desatinado do comunicado, importa ter presente que o município de Ourém, por iniciativa do pessoal do psd, decidiu fazer obra a expensas de terceiros. Isto é tão evidente quão iniludível, por mais que o pessoal do psd pretenda fingir e furtar-se à responsabilidade no caso. Números: em 2005, o município de Ourém realizou 29,1 milhões de euros de receita e 38,8 milhões de euros de despesa; em 2006, realizou 28,0 milhões de euros de receita e 37,0 milhões de euros de despesa; em 2007, realizou 29,2 milhões de euros de receita e 41,9 milhões de euros de despesa; em 2008, realizou 35,8 milhões de euros de receita e 43,9 milhões de euros de despesa. Ou seja, considerando apenas os anos completos referentes ao mandato em curso - o triénio 2006, 2007 e 2008 -, o município de Ourém gastou aproximadamente mais 30 milhões de euros do que a receita que arrecadou. Para se ter uma noção da grandeza destas coisas, durante os últimos três anos de exercício foi feita despesa a mais equivalente ao total de receitas referente a um ano.
Mantendo o mesmo triénio como referência, o município de Ourém decidiu investimento para o qual tinha cobertura financeira apenas na ordem dos 60%. Durante o mesmo período, o conjunto das depesas com pessoal, aquisição de bens e serviços e serviço de dívida cresceu aproximadamente 20%. Em 2006 cifrou-se em 17,1 milhões de euros, em 2008 cifrou-se em 20,6 milhões de euros. Tendo crescido as despesas de funcionamento e tendo-se mantido a dívida de médio e longo prazos - a redução é muito ligeira, passou de 19,1 milhões de euros, em 2006, para 18,9 milhões de euros, em 2008 -, a consequência foi o aumento significativo da dívida de curto prazo e o aumento da demora do pagamento das facturas vencidas a fornecedores e prestadores de serviço. Em 2006 a dívida a terceiros de curto prazo era de 10,1 milhões de euros, em 2008 essa mesma dívida era de 16,8 milhões de euros. No final de 2008, o prazo médio de pagamento do município de Ourém a fornecedores e a prestadores de serviço rondava os onze meses, quase um ano. Portanto, esta é que é esta, ao longo dos últimos anos o pessoal do psd decidiu fazer obra por conta de outrem. Decidiu fazer obra sem garantir previamente o financiamento da mesma. A este propósito, o que se passou com o novo edifício sede do município é paradigmático. Avançou-se para a construção do mesmo, a obra foi adjudicada por 4,6 milhões de euros, consta que o custo final é de 7,5 milhões de euros, tudo isto sem ter sido assegurado empréstimo de médio ou longo prazos para suportar tais custos.
Em face disto, não é fácil disfarçar. Não obstante o pessoal do psd tenta. E tenta. E tenta. E tenta. Tanto que alega alguns factos que, embora lhe assistam a razão, deixam o gato e o rabo do gato, tudo, de fora. Por exemplo, no comunicado referido é invocada uma dívida da administração central ao município de Ourém no montante de 3,8 milhões de euros, segundo apurado em Março último. Dando por verdadeira esta informação, facto é que, no final de 2008, a dívida a terceiros de curto prazo do município era de 16,8 milhões de euros. No caso, abatendo a suposta responsabilidade do governo, a diferença é de 13 milhões de euros. Não são trocos. Pelo que não há como iludir a responsabilidade do pessoal do psd, Vítor Frazão à cabeça, em relação ao problema de liquidez que afecta a tesouraria municipal e que faz com que os pagamentos a fornecedores e prestadores de serviços demorem uma porrada de tempo.
Em suma, há factores vários a complicar a situação financeira do município de Ourém, mas a parte maior da complicação, a parte monumental, é o resultado de uma gestão municipal sem tino ou programa, ditada pelo cérebro e por (des)orientação e decisões do pessoal do psd. Isto é de tal modo evidente que é ridículo e preocupante o facto de esse mesmo pessoal, em vez de assumir as responsabilidades suas no caso, ensaiar manobras de ilusão, com o objectivo de tentar apagar o rasto que vai desde si à nódoa e vice-versa. Reiterando, isto é preocupante em termos de esquiva, por o pessoal do psd furtar-se à assunção da responsabilidade que é dele, mas é mais preocupante pelo que revela além disto. Porque ao não assumir os erros e os disparates cometidos, tentando a transferência da responsabilidade para terceiros via pantomima, o que o pessoal do psd faz é revelar que não aprende com os erros próprios. E pelo menos isso. Não se espera ou exige contrição solene ou parlapié sobre humanismo - que em palavra vale o que vale -, espera-se e exige-se responsabilidade. E a hombridade correspondente. Andaram a gastar muito mais do que arrecadaram. Agora devem e pagam tarde e a maus meses. Por pudor, no mínimo podiam evitar o discurso de mau pagador.
Post scriptum (12-06-2009). Segundo a edição de hoje do Região de Leiria (n.º 3769, 12.Junho.2009, p. 15), o custo do novo edifício sede de município crifra-se não em 7, mas em 7,5 milhões de euros. Daí que o valor tenha sido corrigido acima, no corpo do post.

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