"quem não deve não teme"

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não é preciso ter uma pós-graduação em gestão camarária para adivinhar que esta vai ser a "frase de campanha" quando o assunto fôr a vídeo-vigilância em ourém.

a tese, velha como a sé, implica que se alguém tem alguma coisa contra, é porque tem algo a esconder, e quem fôr de bem concerteza que "compreenderá" e os melhores entre os melhores até "aplaudirão a iniciativa", que "contribuirá para uma melhoria da segurança da comunidade". como é fácil de ver, o paraíso espreita logo a seguir.

há coisa de 3 anos eu não pensava assim mas não andava muito longe: em locais públicos não pode haver desejo de privacidade, quanto mais não seja porque, em último caso, se está em público. depois vim viver para londres, onde se estima que em média cada pessoa é fotografada entre 300 a 600 vezes por dia, graças à maravilha da teelvisão em circuito fechado. fazia-me confusão a princípio, mas hey, em nome da segurança, é uma pequena concessão que se faz, certo?

no reino unido o número de câmaras de vídeo-vigilância é superior a 4 milhões. não se sabe quantas são ao certo, sabe-se que são mais de 4 milhões; e não há semana que um autarca qualquer não anuncie aos sete ventos que vai cobrir a zona histórica da cidade com mais câmaras, para "preservar o património" e "aumentar a segurança". os resultados de tudo isto? bem, de acordo com a polícia, apenas 3% dos crimes são resolvidos com a ajuda do vídeo capturado. 3%. t-r-ê-s p-o-r c-e-n-t-o. e não foi encontrada até agora nenhuma relação entre o número de câmaras e o número de crimes resolvidos, por freguesia, em londres. escusado será dizer que sobre a taxa de crimes que não são cometidos (i.é., a taxa de prevenção, ou o factor de disuasão, como quiserem) pura e simplesmente não há números, mas eu arrisco um valor entre 0% e 0.00059%. e quanto custa esta brincadeira aos contribuintes (entre os quais me incluo)? bem, o número oficial é "alguns biliões de libras, até agora". é lógico, se não se sabe o número de câmaras também não se sabe quanto se gasta. "alguns biliões", para ter 3% dos crimes resolvidos com ajuda do vídeo (note-se que não são "mais 3% de crimes resolvidos").

mas voltemos ao argumento "quem não tem nada a esconder, não tem que se preocupar". e se a mulher do guarda que está de serviço à teelvisão decidir ir dar uma volta com um amigo para os castelos? e quando o grande amigo do sub-chefe lhe perguntar se por acaso já apanhou o filho a fumar? os 2 putos que vão aproveitar a vista lá de cima e se entusiasmam dentro do carro? que crime estão estas pessoas a cometer, para serem vigiadas, e eventualmente prejudicadas (oh sim, já se sabe que vai ser só gente muito responsável a olhar para os monitores)? e quando alguém se lembrar que possivelmente não é má ideia apontar as câmaras para o carro do líder da oposição? e, já agora que as câmaras estão lá, por que não controlar os dias em que as pessoas deitam o lixo fora, por exemplo? e será que reciclam? o céu, para esta gentinha, é o limite.

a falta de privacidade não implica a intrusão. as câmaras de vídeo-vigilância em circuito fechado são uma intrusão. as câmaras de vídeo-vigilância não resolvem nada e previnem menos. aceitar a vídeo-vigilância é dar tudo em troca de nada.

deixando de lado estas questões, passemos a coisas mais práticas: quantos crimes acontecem por ano dentro da muralha? que crimes? quanto custam? quantos feridos há? quantas queixas? e, se não fôr pedir muito, quanto vai custar o equipamento? e a operação do mesmo? que empresa vai ser escolhida e com que critérios? que departamento da câmara ficará responsável por isto? quem é que tem acesso ao vídeo, como e em que condições?

desconfio que nenhuma destas perguntas vai ser respondida pela câmara, que insistirá na "sensação de segurança" e no "quem não deve não teme", pura e simplesmente por que não tem outros argumentos.

a partir daqui é sempre a descer.

p.s. se é dos que pensa que "quem não deve não teme", deixo-lhe um pequeno exercício: por que não instala em sua casa um sistema de teelvisão em circuito fechado e deixa toda a gente aceder às imagens? afinal, quem não deve não teme.

4 Comentários

O futuro do conjuntivo do verbo ser escreve-se "for" e não "fôr"

Há erros que se podem assacar à digitação mas mais atenção ao texto resolveria boa parte deles.

E em português ainda ainda se abre uma frase com maiúscula.

Pfiguices é o que é.

pedro,

muito bom!, apesar de ainda não ser um assunto encerrado, não há muito mais a dizer...

ah, e corrector ortográficos com conjugação verbal é um luxo. o blog e os seus participantes estão certamente muito gratos ao Alfredo.

Caro Alfredo, espero que o seu brio o acompanhe no resto das suas vivências.

Mais não digo, sob pena de me identificar uns trinta erros em duas frases.

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